O uso de drones no Chile e a DAN 151: Inovação normativa necessária, mas insuficiente

by Digital Rights LAC on maio 7, 2015

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O uso de drones é cada vez mais massivo, estão ao acesso daqueles que possam comprá-los e é comum vê-los em jogos de futebol, shows e outros lugares com alta concentração de público. Dependendo do uso que seja dado, estas naves podem vulnerar nosso direito à vida, ao patrimônio e à privacidade. No Chile, acaba-se de regulamentar seu uso, mas, esta normativa é suficiente?

Por Valentina Hernández, Derechos Digitales

A Organização de Aviação Civil Internacional (OACI) estima que somente no ano de 2018 poderia estar disponível uma normativa internacional que regule o uso de drones ou naves não tripuladas. Por se tratar de uma tecnologia em alta, que acarreta vários riscos, a Direção Geral da Aeronáutica Civil do Chile (DGAC) decidiu, corretamente, que era necessário elaborar um regulamento próprio o quanto antes. Assim, em 02 de abril de 2015, apresentou-se a primeira normativa a esse respeito, a Norma Aeronáutica (DAN) 151.

Como já dissemos antes, o uso das aeronaves pilotadas a distância pode supor sérias lesões aos direitos fundamentais da população, como o direito à vida, ao patrimônio e à privacidade. Para a autoridade, a ameaça mais palpável é sobre a integridade física e sobre a propriedade: algumas destas naves podem pesar vários quilos e voar a grande altura, motivo pelo qual caso caiam ou se choquem podem causar sérios danos e até a morte daquele que receber o impacto.

Mas, existe ainda outro grande risco. Dado que estes aparelhos podem tirar fotografias e gravar vídeo da esfera íntima de cada um de nós, a partir do céu, não é difícil imaginar seu uso invasivo à privacidade, com as dificuldades implicadas na busca de algum tipo de responsabilidade legal a esse respeito.

Em relação à proteção ao direito à vida, à integridade física e à propriedade, temos uma série de medidas na DAN 151, destinadas a sua tutela, como a flexibilidade das hélices, a existência de um paraquedas de emergência, o pagamento de um seguro obrigatório e uma declaração juramentada de responsabilidade, entre outros encargos. Igualmente, enumera-se uma lista de restrições na operação de um “drone”, incluída a proibição geral de não colocar em risco a vida das pessoas.

Também são contemplados requisitos como a necessidade de autorização para manipular drones pesados, a obrigação de registro da nave, certificação de ter recebido instrução teórica e prática, e ter sido aprovado no exame.

Em contraste, a regulamentação quanto ao direito à intimidade é muito exígua: apenas encontramos uma proibição geral de “não violar os direitos das pessoas em sua intimidade e privacidade”, sem estabelecer medidas específicas para isso.

Tirando os casos mais evidentes de transgressão (fotos e vídeos) por parte de particulares, temos uma vertente bem mais complexa: a vigilância estatal mediante o uso de drones.

Há uns dois anos, o Estado chileno comprou drones para que as forças de ordem pública os utilizassem em seus trabalhos de vigilânciasem transparecer à cidadania sobre a aquisição e uso destes artefatos. Esta aresta do problema, também não é tratada na DAN 151, apesar de sua relevância.

Os drones podem ser utilizados para registrar pequenos dados que, vistos sem contexto, poderiam parecer irrelevantes; por exemplo, uma fotografia nossa caminhando pela rua. Mas, ao analisar detalhes da fotografia, como a hora, a rua, a direção na qual caminhamos e somar dados de outras imagens similares, torna possível prever condutas e descobrir hábitos de nosso comportamento. Para estes tipos de ameaças, também deve haver uma normativa que trate de regulamentar o uso de tecnologias que podem ser utilizadas com fins invasivos.

Com um pequeno esquadrão de dronespodem ser vigiadas regiões inteiras. As especificações técnicas que dispõem os modelos mais avançados –vários tipos de câmeras e sensores a laser, térmicos, de ultrassom e outras tecnologias– permitiria recopilar tanta informação, que tornaria virtualmente ilusório não só o direito à privacidade, mas também outros, como o direito a um devido processo. O dano potencial ao direito à vida, à privacidade e à propriedade que pode ocasionar o uso estatal de drones é muito maior do que aquele ocasionado por um particular. E, o panorama é ainda mais complexo, se pensarmos que não temos como identificar o uso estatal de drones, pelo menos, atualmente.

O uso de drones não é ruim em si. Como toda tecnologia, podem ter uma série de usos legítimos e de grande utilidade e há aqueles que realizam atividades econômicas lícitas com estas aeronaves. Mas, dados os riscos potenciais de seu uso, é necessário que existam condições mínimas que regulamentem seu uso.

O problema aparece quando o uso de uma tecnologia vulnera os direitos e liberdades fundamentais das pessoas. É por isso que esperamos por uma lei de caráter definitivo que possa garanti-los e protegê-los.