A neutralidade da rede enfraquece no Equador

by Digital Rights LAC on janeiro 31, 2015

zero services

Após um debate bastante breve e com escassa participação da cidadania, a Assembleia Nacional do Equador aprovou a nova Lei Orgânica de Telecomunicações. Um dos objetivos da lei é proteger a neutralidade da rede, mas com uma exceção, que poderia ser desastrosa para esse princípio.

por Andrés Delgado

Lei de Telecomunicações (LOT), que foi uma iniciativa proposta pelo executivo por meio de seu Ministério de Telecomunicações e Sociedade da Informação (MINTEL), confere um forte controle ao presidente, ao mesmo tempo em que busca também garantir os direitos dos usuários, como o princípio da neutralidade da rede, mas com certas dificuldades.

A neutralidade de rede (o trato isonômico dos pacotes de dados, sem distinção por conteúdo, origem e destino, serviço, terminal ou aplicativo), que antes se encontrava no regulamento sobre os direitos dos usuários emitido pelo Conselho Nacional de Telecomunicações, é elevada a lei e mencionada dentro dos objetivos (art. 3) e princípios (art. 4 e 66) da LOT.

O Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas reconheceu a natureza aberta e global da Internet, como uma força que impulsiona a evolução para o desenvolvimento em suas várias formas e reconhece que uma Internet neutra, permite a todos participar em igualdade de condições.

Inclusive atualmente é debatido se gigantes da rede como o YouTube, que sugere e “personaliza” conteúdos mediante seus algoritmos, ou Facebook, que decide o que você vê em seu mural cada vez que você entra, deveriam acolher estes princípios porque, apesar de serem serviços privados, são utilizados por uma grande maioria. Mas, realmente está definida a neutralidade da rede dentro da nova LOT?

O item 18 do art. 22 diz que os assinantes, clientes e usuários de serviços de telecomunicações terão direito a:

“[…]acessar qualquer aplicativo ou serviço permitido disponível na rede da internet. Os prestadores não poderão limitar, bloquear, interferir, discriminar, entorpecer, nem restringir o direito de seus usuários ou assinantes a utilizar, enviar, receber ou oferecer qualquer conteúdo, aplicativo, desenvolvimento ou serviço legal através da Internet ou em geral, de suas redes ou outras tecnologias da informação e as comunicações, nem poderão limitar o direito de um usuário ou assinante a incorporar ou utilizar qualquer tipo de instrumentos, dispositivos ou aparelhos na rede, sempre que sejam lícitos”.

O instrumento que previamente definia a neutralidade da rede incorporava os conceitos de não discriminação com base em uma marca, os quais não foram amparados nesta lei.

Ao contrário, o artigo 64 da lei mencionada que “os prestadores dos serviços poderão estabelecer planos tarifários constituídos (…) por um ou vários produtos de um serviço”.  Isto é preocupante.

Antes Agora
Regulamento.- “Os prestadores de serviço não deverão distinguir, nem priorizar de modo arbitrário, conteúdo, serviços, aplicativos ou outros, baseando-se em critérios de propriedade, marca, fonte de origem ou preferência.” Lei.- “Os prestadores de serviços poderão estabelecer planos tarifários constituídos por um ou vários serviços ou por um ou vários produtos de um serviço, de conformidade com seu ou seus títulos habilitantes”.

Que a lei permita oferecer um serviço de Internet em um plano tarifário (como já feito pelas operadoras telefônicas), poderia ser desastroso para a aplicação do princípio da neutralidade da red. Imaginem o efeito que poderia ter acessar gratuitamente uma rede social e ter um custo para outra, que somente certos serviços de e-mail possam ser utilizados sem restrições e que haja necessidade de pagar uma tarifa para outros.

A restrição ou abuso deste artigo ficará subordinado ao regulamento competente, isso significa que é vulnerável às mudanças na política da MINTEL. Por outro lado, qualquer alteração de longo prazo nesta lei, para bem ou para mal, precisará de uma maioria qualificada na assembleia (metade mais um) por se tratar de uma lei orgânica.

Que sejam levados em conta a nível declarativo os princípios, como o de neutralidade da rede nesta Lei Orgânica de Telecomunicações, é certamente destacável, contudo, ainda faltam definições mais claras e principalmente, mecanismos que permitam sua aplicação.

Precisamos de estratégias que sejam tão efetivas na consecução de direitos, como no acesso à internet. Por isso, é muito importante a criação de canais de retroalimentação e de consulta permanente com a sociedade civil e grupos organizados para desenvolver este tipo de legislação, que impacta na maneira na qual a população acessa e usa a internet. Seria recomendável que estes mecanismos fossem aplicados para a criação do regulamento desta lei.