Governo chileno prestes a submeter seus cidadãos à vigilância norte-americana

by Digital Rights LAC on maio 28, 2014

pasaport_wp

Os benefícios econômicos de estar incluído no Programa Visa Waiver (PVW) dos Estados Unidos são extraordinários. A facilidade de viajar permite o intercâmbio de turistas entre os países, além de outras novas oportunidades econômicas através da redução da fricção produzida pelo processo de aprovação do visto. Contudo, este programa é frequentemente usado como uma forma de obter mais dados dos cidadãos dos países participantes, de modo que a inclusão do Chile no PVW põe em risco a privacidade dos seus cidadãos.

 

Gus Hosein, diretor executivo da Privacy International*.

Na última década, o Governo dos Estados Unidos (EU) tem usado o PVW para exercer pressão sobre outros governos para entregarem os dados dos seus cidadãos. De fato, um país deve cumprir alguns requisitos formais para poder ser elegível e participar do PVW, em grande medida centrados em como os dados são compartilhados entre os dois países. Isto é problemático por causa da baixíssima proteção legal que os EU oferecem a estes dados. A regulação da privacidade deste país é uma das mais fracas do mundo, sobretudo porque a imigração e a segurança nacional são desculpas usadas até para contrariar direitos fundamentais básicos. O que é ainda mais problemático é que as regras dos EU só protegem cidadãos norte-americanos. Qualquer informação enviada pelo governo chileno não estaria protegida pelo sistema norte-americano, já que é fraco. Quando os EU recebem dados de estrangeiros, a informação normalmente é conservada nas suas extensas bases de dados por 100 anos.

Unir-se ao PVW significará que os EU agora têm acesso a uma grande quantidade de informação pessoal dos chilenos. Isto levanta questões sobre qual será a autoridade chilena responsável por decidir e gerir a informação compartilhada com os WU, a possibilidade de que o Governo norte-americana compartilhe os dados com terceiros, assim como a eventual negação arbitrária de ingresso aos EU por causa de dados potencialmente errados em bases de dados chilenas. Um cidadão chileno que é maltratado por causa de tais informações erradas não terá direito a reparação à luz da norma dos EU, e os dados continuarão no país sem real capacidade de apelação.

O PVW também exige que os países membros adotem um “passaporte eletrônico”. Sua introdução no Chile provavelmente implica no estabelecimento, por parte do governo chileno, de uma base de dados biométricos, incluindo as impressões digitais da pessoa, nomes, sexo, data e local de nascimento, nacionalidade e número do passaporte. Até dados mais sensíveis poderiam ser incluídos. A falta de uma lei de dados pessoais melhor no Chile significa que seus cidadãos não têm real proteção legal para assegurar que os dados sejam exatos, que não sejam utilizados para outros propósitos, e que não sejam compartilhados com outros departamentos ou governos.

Mas há medidas concretas que o governo chileno pode tomar para proteger os direitos de privacidade dos seus cidadãos. Primeiro, deve limitar o intercâmbio de informação com as autoridades dos EU. Segundo, criar uma melhor lei de proteção de dados pessoais, exigindo que todos os dados compartilhados com os EU sejam exatos e comprometendo-se a proporcionar aos chilenos os direitos necessários para garantir que sua privacidade seja protegida. Terceiro, a criação ente nacional responsável pela privacidade permitiria que os chilenos solicitassem ajuda quando surgissem problemas, por exemplo, de dados errados que levassem à detenção de chilenos ingressando nos EU. Quarto, deve pedir garantias fortes aos EU sobre como serão tratados e protegidos os dados dos seus cidadãos. Por último, o Chile precisa revisar todos os dados pessoais que hoje estão nas mãos do governo, para assegurar que as práticas de informação cumpram standards internacionais de proteção contra abusos, erros e outros riscos relacionados à privacidade.

Enquanto o Chile tem a oportunidade de unir-se a um clube elite de países cujos cidadãos podem viajar aos EU sem visto, o governo chileno falhou em buscar uma proteção adequada para os seus cidadãos. Estas questões justificam e apoiam a necessidade de implementar standards rigorosos de proteção de dados para garantir que o governo cumpra com suas obrigações jurídicas internacionais de proteção da privacidade dos seus cidadãos. Com a adoção de melhores práticas internacionais em matéria de proteção de informação pessoal, os chilenos poderiam estar mais protegidos.

*Privacy International  foi fundada em 1990, baseia-se na Inglaterra e foi a primeira organização a fazer campanha a nível internacional sobre temas de privacidade.