Tecnología e participaçao política
by Digital Rights LAC on setembro 23, 2015
Há um cenário ainda bastante desfavorável no Brasil para uma maior efetividade da participação democrática direta em âmbito legislativo, com relação à propositura de projeto de lei de iniciativa popular.
Por Eduardo Magrani*
O primeiro obstáculo se deve ao fato de que, segundo a Constituição Federal de 1988, um projeto de lei de iniciativa popular, para ser apresentado validamente, deve conter assinaturas de pelo menos 1% do eleitorado brasileiro (cerca de 1,4 milhão de pessoas). Além desta exigência, que representa por si só um grande empecilho, adiciona-se mais dois obstáculos: o fato de só se aceitar na prática assinaturas físicas, apesar da Constituição e da Lei nº 9.709/98 falarem apenas em necessidade de “subscrição”, sem citar expressamente o meio físico e; o problema de não haver um sistema claro e eficiente de validação das assinaturas. Como resultado destes óbices, a CF/88 comemora 26 anos de idade e, ao longo desse período, somente quatro projetos do gênero foram aprovados no Congresso Nacional.
Ao longo destes 26 anos da “constituição cidadã” outras formas de participação direta previstas na CF/88 como o plebiscito e o referendo, foram usados apenas duas vezes. Na primeira vez, em 1993, a população, através de plebiscito, manteve o presidencialismo e a república como forma e sistema de governo. Na segunda, em 2005, a população, através de referendo, rejeitou a proibição de comercialização de armas de fogo, prevista no estatuto do desarmamento. Fora isso, foram realizados apenas plebiscitos locais sobre a criação de novos Estados e municípios.
É notória, portanto, a subutilização dos mecanismos de participação direta em âmbito legislativo, não obstante o reconhecimento de sua validade em termos democráticos ser bastante evidente mesmo em um sistema majoritariamente representativo como o nosso. Diante deste cenário, buscando superar principalmente o obstáculo relacionado ao alto número de assinaturas físicas exigidas, diversos projetos de lei tramitando atualmente têm como proposta incentivar e permitir mais claramente que os projetos de lei de iniciativa popular possam ser subscritos por meio eletrônico.
No entanto, percebe-se ainda muita insegurança com relação à participação por meios virtuais. Já existem, contudo, mecanismos tecnológicos capazes de reduzir os riscos existentes. Novos caminhos tecnológicos tem permitido minimizar significativamente o risco de violações a plataformas e falsificações das assinaturas através de um sistema mais confiável de autenticação das assinaturas. A certificação digital, por exemplo, é considerada uma ferramenta extremamente eficaz permitindo minimizar os riscos de segurança e alcançar uma equivalência funcional em relação à assinatura manuscrita.
Um sistema de validação mais sofisticado deve ser sempre buscado como forma eficaz de evitar fraudes e fundamental para que se atribua mais credibilidade à participação política online.
A coleta de assinaturas eletrônicas para proposição de projeto de lei de iniciativa popular minimiza, em grande medida, o problema logístico associado à coleta de assinaturas em papel. O procedimento de coleta de assinaturas online atua como agente catalisador do processo democrático viabilizando com muito mais amplitude e eficiência a coleta de milhares ou mesmo milhões de assinaturas num intervalo menor de tempo e com custo reduzido.
Um dos grandes desafios hoje da democracia brasileira é justamente pensar melhores formas de se conjugar iniciativas e mecanismos referentes aos tipos de democracia direta, participativa e representativa, visando atingir uma maior legitimidade do nosso sistema político. Com este objetivo, é fundamental não se desprezar os caminhos viabilizados pela Internet para o aprimoramento da sociedade democrática.
*Doutorando e mestre em Teoria do Estado e Direito Constitucional pela PUC-RJ. Pesquisador líder de projetos no Centro de Tecnologia e Sociedade (CTS) da FGV DIREITO RIO. Professor convidado da graduação e pós-graduação da FGV DIREITO RIO.