Recursos Educacionais Abertos
by Digital Rights LAC on junho 10, 2013
Além da praticidade que o licenciamento livre proporciona ao autor, ele também contribui para um dos objetivos constitucionais mais importantes no âmbito da produção cultural: o acesso à cultura e ao conhecimento.
Por Eduardo Magrani y Pedro Belchior, Centro de Tecnología y Sociedad.
Os Recursos Educacionais Abertos (REA) ou Open Educational Resources (OER) foram citados pela primeira vez em 2002, em conferência da UNESCO. Os participantes do referido fórum definiram os REA como uma ampla provisão de recursos educacionais, disponibilizados graças a determinadas tecnologias da informação e da comunicação, para utilização, consulta e adaptação, viabilizadas pelo licenciamento livre.
Dada a restritividade da proteção autoral, os custos de transação necessários para a distribuição de forma legalizada da obra são geralmente tão altos que costumam inviabilizar tal prática, tendo como consequência deixar tanto autores quanto usuários em uma situação de insegurança jurídica, já que não restaria claro quais usos poderiam ser feitos das obras disponíveis. A maneira encontrada para solucionar este problema foi a criação das licenças livres, que nada mais são do que licenças de uso padronizadas, que especificam quais usos podem ser feitos com determinada obra.
Os Recursos Educacionais Abertos são conceitualmente materiais digitalizados oferecidos livre e abertamente a educadores, estudantes e autodidatas para que possam ser usados e reusados em atividades de ensino, aprendizagem e pesquisa. Os REA são encontrados facilmente na Internet, e podem ser acessados tanto por professores e instituições educacionais quanto por estudantes. Sua principal função é contribuir para a renovação e para a ampliação dos sistemas de educação ao redor do mundo. O projeto Creative Commons exerce um papel fundamental no processo de consolidação dos REA, visto que as licenças CC são um dos meios mais eficazes e práticos de se garantir a vasta disponibilização dos materiais didáticos vinculados aos Recursos Educacionais Abertos.
Atualmente, já se vislumbra várias tentativas de promoção dos REA. Nos EUA, o programa lançado pelos Ministérios norte-americanos, voltado para o ensino superior oferece um fundo de 2 bilhões de dólares para instituições de ensino desenvolverem cursos técnicos sendo todo material produzido em seus quatro anos de duração licenciado em CC-BY. Outro importante marco para a trajetória dos REA foi a iniciativa do MIT (Massachusetts Institute of Technology) de divulgar na rede seus conteúdos digitais. Conhecida como MIT-OPW (MIT OpenCourseWare), tal ação visaria a tornar disponível para consulta on-line todo o material utilizado na maioria dos cursos de graduação e de pós-graduação oferecidos pelo instituto. Posteriormente, seguiram o exemplo pioneiro do MIT as universidades de Princeton, Stanford e Harvard.
No Brasil, uma crescente comunidade se interessa por recursos educacionais abertos. Desde 2008 o Projeto REA-Brazil promove a discussão, oferece treinamento, trabalha na construção de comunidade e geracao de conhecimento, alem de trabalhar com os decisores políticos no executivo e legislativo no desenvolvimento de instrumentos de política publica e leis para promover os REA no Brasil. Uma das vitórias foi a inclusão de REA nas metas do Plano Nacional de Educação, entre outras. Mas a vitória maior que vemos no país é o engajamento social no debate por meio de mídias sociais. Esta comunidade é reconhecida internacionalmente e recebe o apoio da UNESCO, do Creative Commons, da Open Society Foundations e de projetos REA ao redor do mundo. Para apoiar o fortalecimento do debate e da comunidade na área, o projeto REA-Brasil disponibiliza uma série de recursos, incluindo uma extensiva FAQ, que esta, atualmente, sendo traduzida para o Inglês e Espanhol pela Organizacao dos Estados Americanos (OEA).
Ainda no Brasil, a Secretaria de Educação do Município de São Paulo anunciou em 2011 que todo o material produzido para suas escolas estaria disponível para download, atendendo a uma demanda interna e até de outros municípios. A iniciativa tem possibilitado a utilização gratuita por escolas em todo o Brasil de programas didáticos do município paulista, adaptando-os às realidades locais sem qualquer custo para seu licenciamento.
Além disso, como importantes desdobramentos da conscientização global do valor dos REA em âmbito governamental, impulsionados pela “Declaração REA de Paris” (2012) da UNESCO, vale citar algumas propostas legislativas. O Projeto de Lei Federal nº 1513/2011, de autoria do deputado Paulo Teixeira (PT), tem por intenção licenciar livremente todas as obras subvencionadas pelos entes do Poder Público e pelos entes de Direito Privado sob controle acionário de entes da administração pública. E mais recentemente, a Câmara dos Deputados do Estado de São Paulo aprovou na íntegra o Projeto de Lei 989/2011, que institui a política de disponibilização de Recursos Educacionais comprados ou desenvolvidos por subvenção da administração direta e indireta estadual. No entanto, o Governador do Estado de São Paulo, Geraldo Alckmin, vetou o Projeto. Em seu parecer, Alckmin sustentou que o projeto sofria de um “vício de origem”, uma vez que, caberia apenas ao Poder Executivo regular sobre o uso da informática e da Internet em suas próprias atividades. Tal entendimento é bastante controverso e altamente questionável, além de implicar um retrocesso na promoção dos REA.
É certo que se deve tentar alcançar um maior estágio de amadurecimento dos Recursos Educacionais Abertos. A necessidade de se disseminar extensamente conhecimento e cultura não pode ser apenas um dos pontos de uma agenda cujos projetos parecem nunca estar perto de se concretizar. Além da praticidade que o licenciamento livre proporciona, ele também contribui para um dos objetivos constitucionais mais importantes no âmbito da produção cultural: o acesso à cultura e ao conhecimento. Dessa forma, o licenciamento livre permite que a sociedade tenha maior acesso à informação e ao conhecimento e gera um aumento significativo na produção desses bens. Sob essa perspectiva, faz-se mister a construção de uma infraestrutura própria que suporte tal responsabilidade, e os REA representam avanços significativos neste sentido.
Eduardo Magrani y Pedro Belchior, investigadores del Centro de Tecnología y Sociedad (CTS)
E-mail: eduardomagrani (at) gmail.com; pedrobelchiorcosta (at) gmail.com