A CIDH ouviu em audiência o impacto da Internet na defesa e no exercício dos Direitos Humanos

by Digital Rights LAC on dezembro 19, 2014

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Pela primeira vez, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) concedeu uma audiência temática para ouvir argumentos sobre o impacto da Internet na defesa e no exercício dos Direitos Humanos.

Eduardo Bertoni (@ebertoni).*

Como órgão que monitora o respeito e o exercício dos direitos humanos em nosso continente, em seus períodos de sessões -em geral dois ou três por ano- a CIDH concede audiências sobre os mais diversos temas. Como se pode imaginar, são inúmeros pedidos e é por isso que a mera outorga da audiência demonstra o interesse da CIDH em se envolver no assunto proposto por diversas organizações.

O pedido da audiência, coordenado pelo CELE (Centro de Estudos em Liberdade de Expressão e Acesso à Informação da Universidade de Palermo (CELE) —Argentina—, na verdade foi o fruto de uma tarefa coletiva na qual participaram as organizações Direitos Digitais —Chile—, a Fundação Karisma —Colômbia—, a Associação para o Progresso das Comunicações (APC) —internacional—, o Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas —Brasil— e a Associação pelos Direitos Civis (ADC) —Argentina—), e que contou com o apoio de uma vintena de organizações da região. Representantes dos quais havíamos pedido a audiência, chegamos a Washington DC, sede da CIDH, e em 28 de outubro de 2014 ao meio-dia expusemos durante aproximadamente 45 minutos nossas preocupações.

Por que esta audiência era importante? Demos a resposta perante CIDH, e para nós era clara: em razão da Internet e das novas tecnologias constituírem uma ferramenta para a promoção e proteção dos direitos humanos em todo o mundo, é fundamental que o Sistema Interamericano de Direitos Humanos (SIDH) não fique à margem da discussão universal que vem ocorrendo. Nesse sentido, destacamos que no âmbito do sistema universal de proteção dos direitos humanos, os debates sobre o vínculo entre Internet e Direitos Humanosvem ocorrendo, pelo menos, há cinco anos. Prova disso são os inúmeros pronunciamentos e relatórios surgidos pelos órgãos e especialistas na proteção dos direitos humanos das Nações Unidas, incluindo resoluções da Assembleia Geral (1), do Conselho dos Direitos Humanos (2) relatórios do Escritório do Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos (3), e Relatórios de diversos Relatores Temáticos (4), além das diversas organizações não governamentais dedicadas à proteção dos direitos humanos
nestes assuntos (5).

Contudo, no âmbito regional, somente a Relatoria Especial sobre Liberdade de Expressão teve que se pronunciar sobre o fenômeno da Internet. Assim o fez nas Declarações Conjuntas com o Relator das Nações Unidas, OSCE e/ou a Relatora Especial de Liberdade de Expressão da Comissão Africana de Direitos Humanos, de 2001 (6) 2005 (7) 2011 (8) 2012 (9) e 2013 (10) e no seu relatório de dezembro de 2013. A contribuição da Relatoria foi bem significativa e comemoramos. Mas, é importante que no SIDH, seja aprofundado o debate em torno da interação entre Internet e outros direitos convencionais, não só a liberdade de expressão.

A realização da audiência temática foi o cenário ideal para pedir a participação da CIDH no debate em torno desses assuntos com uma dupla finalidade: por um lado, para questionar sobre suas próprias capacidades de promoção e proteção de direitos humanos na era digital; e, por outro, para se constituir em ator e referente quanto à defesa e proteção dos direitos humanos nesta era.

Para ampliar a agenda dentro do SIDH, propusemos assuntos desde a relação entre Internet e o direito àigualdade e não discriminação, até a proteção do direito à intimidade, a liberdade de expressão, a educação e cultura, e para finalizar, o tema da importância do acesso à Internet na região para o exercício de todos esses direitos fundamentais.

Concluindo, acredito que não me engano em afirmar, que a audiência foi recebida como um importante passo no reconhecimento da vigência e importância do uso da Internet em seu vínculo com os direitos humanos.

*Eduardo Bertoni (@ebertoni). Doutor em Direito. Diretor do Centro de Estudos em Liberdade de Expressão e Acesso à Informação (CELE) da Universidade de Palermo. Ex-Relator Especial para a Liberdade de Expressão da OEA.

Tradução: Ideias & Imagens

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1 Assembleia Geral das Nações Unidas, A/RES/68/167. 21 de janeiro de 2014, Resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas sobre o direito à privacidade na era digital, de 18 de dezembro de 2013. 68/167.

2 Conselho de Direitos Humanos ONU, Promoção, proteção e desfrute dos direitos humanos na Internet, A/HRC/26/L.24, 20 de junho de 2014, disponível em http://daccess-ddsny.un.org/doc/UNDOC/LTD/G14/059/70/PDF/G1405970.pdf?OpenElement

3 Vide UN HRC, The Right to Privacy in the Digital Age, A/HRC/27/37 1. Junho 2014

4 Frank La Rue, “Report of the Special Rapporteur on the promotion and protection of the right to freedom of opinion and expression”, A.HRC.17.27, http://www2.ohchr.org/english/bodies/hrcouncil/docs/17session/A.HRC.17.27_en.pdf

p. 4; Frank La Rue, Relatório do Relator Especial sobre a promoção e proteção do direito à liberdade de opinião e de expressão A/66/290, Agosto 2011; Frank La Rue, “Report of the Special Rapporteur on the promotion and protection of the right to freedom of opinion and expression,” A/HRC/23/40, 17 Abril 2013;

5 Written statement* submitted by Reporters Without Borders International, a non-governmental organization in special consultative status, A/HRC/24/NGO/63, setembro 2013.

6 DECLARAÇÃO CONJUNTA dos Mecanismos Internacionais para a Promoção da Liberdade de Expressão, Desafios à Liberdade de Expressão no Novo Século, 2001, disponível em http://www.oas.org/es/cidh/expresion/showarticle.asp?artID=48&lID=2.

7 DECLARAÇÃO CONJUNTA do Relator Especial para a Liberdade de Expressão da Comissão Africana de Direitos Humanos e dos Povos e o Relator Especial para a Liberdade de Expressão da Comissão de Direitos Humanos da OEA, 2005 disponível em http://www.oas.org/es/cidh/expresion/showarticle.asp?artID=394&lID=2.

8 DECLARAÇÃO CONJUNTA SOBRE LIBERDADE DE EXPRESSÃO E INTERNET, O Relator Especial das Nações Unidas (ONU) para a Liberdade de Opinião e de Expressão, a Representante para a Liberdade dos Meios de Comunicação da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE), a Relatora Especial da Organização de Estados
Americanos (OEA) para a Liberdade de Expressão e a Relatora Especial sobre Liberdade de Expressão e Acesso à Informação da Comissão Africana de Direitos Humanos e dos Povos (CADHP) 2011, disponível em http://www.oas.org/es/cidh/expresion/showarticle.asp?artID=849&lID=2.

9
DECLARAÇÃO CONJUNTA SOBRE LIBERDADE DE EXPRESSÃO E INTERNET do Relator Especial das Nações Unidas (ONU) para a Liberdade de Opinião e de Expressão e a Relatora Especial para a Liberdade de Expressão da Comissão de Direitos Humanos da OEA, 2012, disponível em http://www.oas.org/es/cidh/expresion/showarticle.asp?artID=888&lID=2.

10 DECLARAÇÃO CONJUNTA SOBRE PROTEÇÃO DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO E A DIVERSIDADE NA TRANSIÇÃO DIGITAL TERRESTRE, do Relator Especial das Nações Unidas (ONU) para a Liberdade de Opinião e de Expressão, a Representante para a Liberdade dos Meios de Comunicação da Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa (OSCE), a Relatora Especial para a Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA e a Relatora Especial sobre Liberdade de Expressão e Acesso à Informação da Comissão Africana de Direitos Humanos e dos Povos (CADHP), de 2013, disponível em http://www.oas.org/es/cidh/expresion/showarticle.asp?artID=921&lID=2. E Declaração conjunta sobre programas de vigilância e seu impacto na liberdade de expressão Relator Especial das Nações Unidas (ONU) para a Proteção e Promoção do Direito à Liberdade de Opinião e de Expressão Relatora Especial para a Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, de 2013, disponível em http://www.oas.org/es/cidh/expresion/showarticle.asp?artID=926&lID=2.